TOLERÂNCIA

21 de agosto de 2012, às 15h12 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos

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(Este artigo não é inédito. Faz parte de um “pacote” de quatro artigos publicados em 2003, sobre o tema “Valorização Profissional”. Mas o tema merece voltar, de vez em quando, por tratar de uma praga de difícil extinção).

A REALIZAÇÃO é parte fundamental do caminho que leva à Valorização Profissional pois quem não realiza não se realiza.
Do que estamos falando? De quem estamos falando?
Dos caneteiros. Dos acobertadores, assinadores de planta, capachos de desenhistas… Estamos falando dessa raça nefasta de levianos irresponsáveis que desgraça a profissão, jogando lama sobre tantos anos de dedicação e sacrifícios deles próprios e também dos seus colegas.
Esse bando que não realiza nada, nunca. E que, por isso, nunca se realiza profissionalmente. Que não sente orgulho do que faz. Que não tem dignidade profissional.

Me desculpem pelo destempero, mas esse é um tema que me ferve o sangue.
Os acobertadores constituem um pequeno grupo (e têm seus similares em qualquer outra profissão, não há dúvida). Nunca representam mais do que oito ou dez por cento de uma determinada comunidade profissional. Mas o estrago que conseguem fazer é uma coisa descomunal.

São uma praga. Um câncer. Uma desgraça!
É um problema que precisa ser enfrentado com coragem e determinação. Acredito que o sistema profissional (Confea/Crea /Entidades de Classe/Sindicatos…) precisa declarar uma luta sem tréguas a essa causa. A prática do acobertamento precisa ser considerada falta gravíssima e o castigo precisa ser extremamente severo, pois trata-se de um desvio que leva às mais nocivas conseqüências para a profissão.

Nenhum estudante de Engenharia, Arquitetura ou Agronomia “sonha” em ser um caneteiro. Nenhum profissional recém-formado quer ser um acobertador… A escolha desse caminho se dá, mais tarde, por:
1) Fraqueza de Princípios;
2) Dificuldades Naturais do Mercado;
3) Impunidade Legal;
4) Impunidade Moral.

A Fraqueza de Princípios pode e deve ser combatida durante o processo de formação, com a Inclusão Profissional.
A Inclusão Profissional deve ser promovida pelo sistema (Confea/Crea/Entidades de Classe, Sindicatos…) através de palestras, cursos, seminários, eventos sociais e esportivos cujo objetivo é a transmissão dos preceitos éticos e morais do exercício da profissão.

O Código de Ética profissional precisa ser introduzido nas universidades e sua discussão e prática deve ser permanente. Da festa do calouro ao dia da formatura.

O estudante de Agronomia, de Engenharia, de Arquitetura e das demais profissões do sistema precisa se sentir DENTRO. Precisa sentir-se Engenheiro, Arquiteto e Agrônomo, desde o primeiro dia de aula. Só assim irá desenvolver o necessário sentimento de respeito e ética para com os colegas.

Alguém aí tem coragem de dizer que isso não reduziria consideravelmente o número de caneteiros no mercado ?

As Dificuldades Naturais do Mercado são outra explicação (não justificativa) para o desvio que alguns colegas tomam em direção à prática do acobertamento.

Pode ser combatida com informação, treinamento e preparo empresarial.

Se o profissional não sabe como enfrentar as dificuldades naturais do mercado… dá-lhe cursos de gestão empresarial, marketing, administração de custos, relacionamentos interpessoais… essas coisas que, infelizmente, ainda não temos nas escolas de engenharia, de arquitetura e de agronomia.

É preciso aprender uma coisa simples: ganha-se mais trabalhando direito. E ainda tem a vantagem de que isto nos dá realização profissional e dignidade (leia-se “valorização profissional”)

A Impunidade Legal, bem como a Impunidade Moral são responsabilidades do sistema e também nossa. De cada profissional individualmente.

O sistema precisa criar mecanismos para punir com maior RAPIDEZ e RIGOR os casos de acobertamento.

Nós, profissionais, precisamos ser menos tolerantes com esse desvio moral.
Não podemos mais fechar os olhos e fazer de conta que não é conosco.

As entidades de classe precisam ter uma comissão permanente de “patrulha” e esclarecimento (o primeiro estágio) para fazer um “policiamento ostensivo” e impedir que um desvio eventual se torne uma prática profissional permanente.

É preciso eliminar a possibilidade de um profissional acobertador sentir-se confortável ou seguro.
É preciso dar a ele apenas uma saída. Apenas um caminho. O retorno à prática profissional digna e correta.

Essa luta é de todos. De toda a classe. Não é uma coisa pontual.

Se eu, um engenheiro eletricista, estiver cometendo acobertamento, o meu colega agrônomo, que pensa que não tem nada a ver com isso, estará, também, pagando uma parte da conta.

Valorização profissional é um conceito muito complexo. Difícil de ser obtido.

A maior dificuldade está justamente no fato de que é uma conquista coletiva. Depende de todos e de cada um.

ÊNIO PADILHA – engenheiro, escritor e palestrante. Formado engenheiro pela UFSC em 1986, especialista em Marketing Empresarial pela UFPR, em 1996/97 e atualmente é Mestrando em Administração pela UNIVALI (2005/2006).