Mineração não é medida provisória
14 de novembro de 2017, às 17h41 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos
No dia de 26 de julho, foram publicadas no Diário Oficial da União as medidas provisórias 789, 790 e 791, que altera parte da legislação minerária. Entre as modificações, está a extinção do Departamento Nacional de Produção Mineral e a criação da Agência Nacional de Mineração, a ampliação de valores da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, entre outras modificações.
O Marco legal da mineração estava em discussão no Congresso nacional desde 2011, quando foi proposto o Projeto de Lei nº 37 de mesmo ano. Mais tarde, o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional, em junho de 2013, o PL 5.807/13, uma nova proposta de marco regulatório na mineração. Este projeto teve 372 emendas apresentadas, e o relator, o Deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), produziu três relatórios, na forma de substitutivos, ao longo do trâmite. Desde o ano passado o texto estava para ser votado na Câmara dos Deputados, mas sequer chegou a ser apreciado no plenário.
Para quem não sabe, a edição de medidas provisórias (MP’s) é um mecanismo existente no Brasil no qual o presidente cria provisoriamente uma lei. O período de validade de uma MP é de 60 dias prorrogáveis por mais 60, e, se neste período as MPs não forem votadas pelo congresso, elas perdem a validade e volta a valer a legislação antiga. Porém, se aprovadas, as MPs podem possuir textos e aspectos muito diferentes das propostas originais, além disso, a edição de leis por MPs claramente é um mecanismo pouco democrático e que não permite o devido debate sobre o tema. Quantas destas MPs serão aprovadas e qual será o texto final? Essa pergunta é difícil de ser respondida visto que somadas, as MPs receberam quase 500 emendas.
Ou seja, temos um marco legal da mineração que vale por apenas 120 dias. E qual o maior problema disso? Você pode não gostar da mineração, mas tudo na nossa vida é feito com bens minerais. Desde o computador que você usa, a sua casa, o prato de comida e a comida que está no prato tem algo da mineração. As rochas e a mineração permitem que tenhamos qualidade de vida. Quando o homem desceu da árvore, a primeira tecnologia que ele desenvolveu foi à pedra lascada, que nada mais é do que utilizar uma rocha como ferramenta. Assim, uma das primeiras atividades do ser humano foi a de minerar.
Um empreendimento de mineração custa muito caro, não tem grandes linhas de financiamento, como o agronegócio, e pode levar de 6 a 10 anos para se iniciar as atividades. Para implementar um empreendimento mineral, são necessários inúmeros estudos geológicos e ambientais. Agora, como qualquer outro investidor, o empreendedor mineral busca, acima de tudo, segurança jurídica. A mudança do marco legal da mineração, através de medidas provisórias, demonstra uma fragilidade legal do setor, pois se foi feito desta forma agora, um governo próximo pode novamente mudar a legislação do setor por MPs.
Quais os efeitos imediatos dessa mudança? Conforme publicado no Correio Braziliense: “Entre as medidas, deve alterar regras de licença ambientais e de fiscalização e ampliar o limite de participação do capital estrangeiro, que hoje é de 49%, até 100% na indústria de mineração”. Ainda na mesma matéria, o jornal traz em outra passagem o seguinte conteúdo: “Para garantir uma receita extra de R$ 1,5 bilhão, o governo pretende mudar alíquotas de royalties de exploração de minerais, que podem variar de 2% a 4%, e aumentar a arrecadação federal”. Já, segundo o G1, “Temer muda royalties da mineração e prevê arrecadar 80% mais; agência substituirá DNPM”. Veja só!
As mudanças por MP tiveram como um dos principais aspectos ampliar a arrecadação, mas a que custo?
Deixo claro aqui que não estou julgando o texto em si, que traz também algumas mudanças positivas, esse artigo é uma crítica ao fato de se modificar uma lei tão importante por um mecanismo inapropriado e pouco democrático. Não faz sentido publicar um MP quando há um texto para ser votado no Congresso e que trata do mesmo tema. A mineração deve ser tratada de forma séria, além de representar historicamente uma participação direta de cerca de 4% do PIB. A atividade mineral é fundamental para que tenhamos nossas casas, ruas, carros, computadores e todas as outras coisas que usamos no nosso dia-a-dia. A mineração não é medida provisória.
Autor: Caiubi Kuhn
Geólogo, mestre em Geociências pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
Docente do Instituto de Engenharia, Campus de Várzea Grande, Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT);
Conselheiro-Titular do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA);
Diretor de Benefícios e Relações Sindicais do Sindicato dos Geólogos do Estado de Mato Grosso (SINGEMAT);
Presidente da Associação de Geólogos de Cuiabá (GEOCLUBE)
E-mail: caiubigeologia@hotmail.com