A construção civil e os indicadores de desempenho

9 de outubro de 2014, às 15h17 - Tempo de leitura aproximado: 6 minutos

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“A construção civil, assim como todo e qualquer processo, deve submeter-se a parâmetros de avaliação, atendendo a todos os requisitos contidos no projeto executivo, especialmente no que se refere à Segurança e Desempenho; deve atender às expectativas do cliente e atingir os objetivos para os quais foi pensada e planejada”.

 

Sou engenheiro civil, atualmente dedicando-me à área das estruturas e ao magistério, em disciplinas do curso de Engenharia Civil, correlatas à área. Incomodado com os rumos que tem tomado a construção civil e especialmente a qualidade das estruturas, encurralados pelas tendências de mercado, entendi por bem manifestar-me, singelamente, a saber se encontro guarida em minha preocupação solitária, mas possivelmente compartilhada por muitos cidadãos e profissionais, já que convivemos diuturnamente no uso dos sistemas estruturais de engenharia.

 

Em idos anos de 2003, quando então eu laborava na Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, discorri em trabalho monográfico sobre os “Indicadores de Desempenho nas Ações de Polícia Preventiva”. O objetivo principal era fundamentar ao Comandante, Gestor, ao Secretário ou ao Poder Executivo, mas especialmente ao povo, que a ação de polícia preventiva pode e deve ser mensurada em princípios basilares, simples, objetivos, de considerável tenacidade, a fim de que não sejam facilmente corruptíveis e manipuláveis por um possível Gestor/Operador mal intencionado.

 

Sugeri, entre outros, que o Tempo Resposta é um efetivo indicador de eficiência nas Ações de Polícia Preventiva. Sob princípios da metodologia científica apresentei um gráfico concluindo que a possibilidade de resultados eficazes na ação preventiva é inversamente proporcional ao tempo gasto até a chegada do policiamento no local da ocorrência. E, desta forma, deve ficar claro ao Gestor e ao cidadão – que normalmente tem grande consciência disso – que não se pode esperar qualquer resultado positivo quando passado considerável tempo após o ato inflacionário. 

 

Por outro lado, no que se refere à causa efeito da Ação de Polícia Preventiva, a Taxa de Esclarecimento Criminal é outro indicador do qual tanto o Gestor quanto o cidadão pode dele se apossar, ladear-se, e torná-lo um verdadeiro conselheiro na avaliação das Ações de Segurança Pública.  Países de primeiro mundo avaliam seus Sistemas de Segurança diuturnamente monitorados por este critério. No Brasil ainda amargamos pesadas estatísticas, cujo número de homicídios superam os 70% sem esclarecimento ou condenação.

 

Sob estes parâmetros, voltemos nossos olhos à construção civil e especialmente às estruturas. A engenharia Estrutural possui e adota indicadores fortes, consistentes, objetivos e os quais podem ser facilmente monitorados, seja pelo engenheiro de projeto, seja pelo engenheiro de execução, seja pelo Órgão Fiscalizador, tanto de ordem privada como de ordem pública.

 

Como exemplo, o consumo de aço por metro cúbico de concreto víscera a estrutura e não lhe permite ocultar a relação entre esforços e carregamentos. Ao engenheiro de estruturas, bastando a observação desta taxa de consumo, permite-lhe avaliar da regularidade do cálculo. Causando-lhe estranheza, incumbe-se de imediata verificação, a saber, os motivos pelos quais tal estrutura possui coeficiente incompatível com a natureza dos esforços, seja este desvio para mais ou para menos, em relação aos padrões adotados ou normativos.

 

De semelhante forma, o Engenheiro de Execução deve crivar o projeto de olhar crítico, não permitindo que uma possível relação inadequada seja executada tão somente porque está registrada em um projeto, ainda que contenha assinaturas, carimbos e aprovações tais que lhe atribua requisitos de legalidade, rotinas e processos. Detectada alguma anormalidade, padrões que não configuram o hodierno do cálculo estrutural, detenha-se na execução imediatamente. Sob todos os princípios da ética, com o respeito ao autor do projeto, faça-se as devidas verificações, partilhando-as com responsáveis superiores e com o próprio autor do projeto, se for o caso. Citei apenas um indicador, mas muitos outros indicadores são avaliados, seja na fase de projeto ou execução da obra/edificação.

 

Ética e didaticamente, este é o caso. Entretanto, não é o que tenho visto. Encontro um mercado perdulário que contrata engenheiros júniores, a salários abaixo do piso da categoria, para obras de grande porte, de enorme importância econômica e social. Engenheiros estes sem experiência naquele tipo de obra e nas quais sequer estagiaram e não carregam consigo a menor das experiências de obras anteriores, mesmo porque grandes obras não são tão frequentes. Encontro planilhas orçamentárias que não contemplam a realidade do custo e da construção civil, assim como não contemplam os critérios de segurança normativamente definidos. Encontro projetos e cronogramas, especialmente, definidos com base em interesses políticos, para os quais toda a prática construtiva, em suas diversas fases e rotinas, é simplesmente ignorada.

 

E onde estariam os indicadores da Construção Civil? Porque não peneirar nossas estruturas e obras, seja na fase de projeto ou execução, na peneira dos Indicadores de Desempenho? A certeza eu tenho é a de que a falha não está na Engenharia. Cada dia que leio alguma Norma relativa ao Desempenho das Estruturas, à Segurança ou aos Procedimentos de Execução, ainda mais forte afirmo a mim mesmo: se há falhas no processo, esta não é advinda de lacunas em Normas ou Estudos de Laboratório voltados à Segurança e Desempenho das Obras de Engenharia.

 

Nesta realidade paradoxal espero devotar meu estudo e meu suor. Estas palavras dedico a meus alunos de graduação: não se deixem forjar pelas especulações de mercado. Sejam firmes e fortes nas recomendações e princípios da engenharia. Permitam-me os engenheiros recém formados, colegas de labuta: aventurem-se pelo mercado no limite de vossa competência e sintam-se bem ante a orientação, oxalá reprimendas, dos mais experientes e estudiosos do assunto. E não se ofendam meus colegas mais antigos: somos responsáveis pela formação deste mercado e não podemos nos dar o direito e a comodidade de arrematar nossos serviços. Temos um ofício e um ministério. E, finalmente, aos dignos empreiteiros: o fruto de nosso trabalho há de ser saboreado ou deglutido pelo cidadão: no prazer ou na dor daquele que acreditou no conceito historicamente construído.

 

Obrigado!!! 

 

*Paulo de Faria Ávila é Engenheiro Civil e Professor Universitário