Energia e desenvolvimento

30 de janeiro de 2007, às 0h00 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos

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Doutor do Departamento de Engenharia Elétrica da UnB escreve sobre o que é preciso para garantir uma oferta adequada de energia no Brasil.

Para destravar o Brasil é preciso, primeiro, garantir uma oferta adequada de energia. Os investimentos em infra-estrutura antecedem qualquer projeto de desenvolvimento. Nos últimos vinte cinco anos, o Brasil cresceu a uma taxa média de 2,5% ao ano. Taxa inferior à média mundial e muito menor que a dos países em desenvolvimento. Neste mesmo período, o consumo de energia elétrica cresceu muito. A taxa média foi de 5% ao ano. Apesar deste forte crescimento, o nosso consumo per capta ainda é inferior à média mundial e muito menor que o consumo dos países desenvolvidos. A característica mais importante da indústria de energia elétrica brasileira é a sua enorme necessidade de expansão.

Para continuar crescendo à mesma taxa, são necessários investimentos da ordem de 20 bilhões de reais por ano em infra-estrutura. Mesmo com o aumento da carga tributária, o governo não tem conseguido aumentar as aplicações nessa área. Nos últimos dez anos, o investimento público ficou sempre abaixo de 1% do PIB. Estes dados mostram que, para garantir a expansão, serão necessários investimentos privados. Sem investimento, não haverá expansão da oferta e a crise de energia será inevitável. Mas o investimento privado de longo prazo exige uma taxa de remuneração atrativa e a confiança de que os contratos e as regras serão cumpridos.

No caso brasileiro, onde o sistema elétrico é hidrotérmico, existe ainda a incerteza relacionada ao nível dos reservatórios. O combustível que aciona as nossas turbinas é a água armazenada nas nossas barragens. Quando os reservatórios estão baixos, como é o caso atual, o Operador Nacional do Sistema (ONS) tem que usar outros combustíveis como, por exemplo, o gás natural. Nos próximos dois anos, a oferta de gás natural será menor que a demanda. Se as usinas termoelétricas forem acionadas, não haverá combustível para abastecê-las. A previsão de risco de déficit, devido à falta de gás chega a 15% na região Sudeste, já em 2007.

Felizmente, as chuvas deste verão estão acima da média histórica e os reservatórios estão se recuperando. Do lado da demanda, infelizmente, o consumo previsto também foi reduzido devido à redução do PIB projetado para o ano que vem. Estes fatores conjunturais indicam que não haverá falta de energia em 2007. No entanto, é preciso resolver os problemas estruturais para garantir investimentos privados de longo prazo no setor energético brasileiro. Entre os mais importantes estão as questões ambientais, a excessiva carga tributária e a garantia de novos investimentos.

Para tratar a questão ambiental, é preciso ter em mente que todo aproveitamento energético causa impacto ambiental. O verdadeiro problema está na elaboração de projetos onde os impactos sejam minimizados. A previsibilidade da obtenção de uma licença ambiental reduziria muito o risco associado aos novos empreendimentos e, conseqüentemente, os custos. Os órgãos de proteção ambiental têm que trabalhar para viabilizar os bons projetos.

Neste sentido, o país deve continuar investindo nas fontes renováveis. Somos referência mundial neste quesito. Quarenta e quatro por cento da nossa matriz energética é renovável. A incidência de energia solar por metro quadrado, no Brasil, é quase o dobro da dos países de clima temperado. Não podemos perder esta enorme vantagem competitiva.

A carga tributária do setor elétrico é outra questão que merece atenção. Ela chegou a 43,7% em 2006. Essa carga eleva as tarifas e inibe o desenvolvimento. É preocupante perceber que os encargos e tributos associados à energia, que já são altos, continuam crescendo. Uma boa sinalização seria inverter esta tendência.

Finalmente, para garantir novos investimentos privados, é importante fortalecer as agências reguladoras. O investidor privado deve ser tratado de forma isonômica com relação ao investidor público. Isso não pode ser feito diretamente pelo ministério. O governo é o dono das empresas públicas e não é isento. Uma agência forte, autônoma, que preste contas ao Congresso Nacional, é a garantia de que os indispensáveis contratos de longo prazo serão cumpridos, independentemente das naturais mudanças de governo. Se estes problemas não forem equacionados e resolvidos estaremos sempre contando com as chuvas para adiar um novo apagão.

Ivan Camargo é doutor do Departamento de Engenharia Elétrica da UnB e foi assessor da Diretoria da Aneel de 1999 a 2003.

Autor: Ivan Camargo *
Fonte: Agência UnB