Grupo de índios isolados em fuga constante

26 de março de 2007, às 0h00 - Tempo de leitura aproximado: 2 minutos

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Fonte: Diário de Cuiabá

Para Funai, eles são remanescentes dos povos Kawahiwa, que há décadas sofrem as variadas formas de exploração da área e, em conseqüência, desaparecem

No mais cobiçado trecho contínuo de florestas de Mato Grosso habita um povo em permanente fuga. São aproximadamente três dezenas de pessoas, que sobrevivem de coleta, caça e pesca, e que usam de um conhecimento profundo da região para evitar o contato com as frentes de garimpo e expansão madeireira.

Sem saber, eles protagonizam um dos mais controvertidos episódios da curta história do município de Colniza (na região noroeste do Estado, a 1.165 quilômetros de Cuiabá) – o mais violento do país, segundo a Organização dos Estados Ibero-americanos.

Para a Fundação Nacional do Índio (Funai), o grupo é composto pelos remanescentes isolados dos povos Kawahiwa. Entre os moradores e políticos da cidade, porém, os índios são qualificados como uma espécie de ficção com chancela antropológica.

“Não existe nem língua, nem etnia definida. Não vamos deixar nossa terra se transformar numa reserva sem que haja índios”, esbravejou o prefeito Adir Ferreira, em nota distribuída pela Federação da Agricultura e Pecuária (Famato).

Na semana passada, a Funai mandou publicar no Diário Oficial da União uma portaria que estabelece restrição ao direito de ingresso, locomoção e permanência de “pessoas estranhas” em 411 mil hectares delimitados para a Terra Indígena Kawahiva do Rio Pardo.

A partir de agora, a área segue para as fases finais de demarcação e homologação, respeitando-se um prazo de 90 dias para eventuais recursos – que, presume-se, serão muitos, uma vez que a área delimitada incide total ou parcialmente sobre 35 títulos expedidos pelo Incra e Intermat (ver matéria e quadro nesta edição).

“Estas são as áreas imprescindíveis para garantir àqueles índios o seu bem estar futuro, pondo fim a décadas de pressão e cerceamento à sua liberdade (…) há pelo menos seis décadas”, diz trecho do relatório de identificação, assinado pelo antropólogo Gilberto Azanha.

Fugas – As primeiras referências a grupos Kawahiva datam de 1750, diz Azanha. Em 1913, segundo o antropólogo, o marechal Cândido Rondon manteve contato com três subgrupos, aos quais denominou “tupi-cavahiba”. Vinte e cinco anos mais tarde, seria a vez do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss.

“As fontes históricas e etnográficas demonstram que os Kawahiva estavam distribuídos em pequenos grupos locais com território determinado e ocupando uma extensa região nos interflúvios dos rios Aripuanã, Roosevelt e Machado e seus afluentes”.

Estas populações indígenas sofreram pesadamente os vários ciclos de exploração econômica daquela região. “Caucheiros, seringueiros e copaibeiros dos anos 1920 aos 1950; nos 1950-60, garimpeiros, gateiros e copaibeiros; nos 1970-1980, garimpeiros e copaibeiros e estes últimos e os madeireiros nos 1990-2000 até o presente”.

Os Kawahiva do Rio Pardo seriam, portanto, os remanescentes dessa história de agressões continuadas. Sobreviventes, mas com capacidade de se reconstruir demográfica e culturalmente, diz o antropólogo. “Se o Estado brasileiro lhes garantir a segurança necessária, temos a absoluta certeza que os Kawahiva do Pardo experimentarão um crescimento demográfico significativo”.