O Brasil distante da Universidade

21 de agosto de 2012, às 15h12 - Tempo de leitura aproximado: 4 minutos

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Sátyro Pohl Moreira de Castilho, engenheiro civil, presidente do Crea-MT. Em 12/07/2004

Uma pesquisa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgada na semana passada, mostra que o Brasil está atrás da Argentina, Paraguai e Uruguai em número de pessoas com nível educacional superior. Enquanto o Brasil possui 8% da população entre 25 e 64 anos com nível superior, o Paraguai tem 11%. Argentina e Uruguai apontam índices, respectivamente, de 14% e 9%.

Os dados foram coletados em 2001 e revelam também a disparidade entre os índices verificados nos países em desenvolvimento e naqueles ditos do “primeiro mundo”. O Canadá tem 41% de sua população graduada em nível superior. Estados Unidos conseguiram um índice de 37%. Japão, Austrália e França apresentam, respectivamente, 34%, 29% e 22%.

Os dados confirmam, portanto, a íntima relação entre desenvolvimento sócio-econômico e ensino superior. Parece uma constatação óbvia, mas desde o governo Sarney assistimos à aceleração do desmantelamento do ensino superior no Brasil em sua infra-estrutura técnica e pedagógica. Quem realmente tenta fazer pesquisa nas universidades brasileiras sabe do que estou falando.

Cada setor no país que conseguiu um nível de progresso tecnológico, econômico e/ou social tem origem certamente no ensino superior. O cerrado brasileiro alcançou os números de produtividade agrícola por causa da Universidade. O parque industrial brasileiro se desenvolveu e se consolidou devido à Universidade. Mas há uma crise universitária que isola a Universidade do meio social e faz com que a sociedade não saiba o que ocorre nos campi do país.

Recentemente, Cristovam Buarque – ainda como ministro da Educação – disse em Cuiabá que a Universidade brasileira se transformou em um centro de formação de prestadores de serviço para a elite. Citou exemplos nas áreas de Medicina e Arquitetura para mostrar que, embora formadas com recursos públicos, as pessoas oriundas do ensino superior pouco geram retorno para a sociedade, o que – em um país carente – é uma constatação dolorosa.

Mas tal constatação não significa jogar sobre as costas do graduado o peso dessa responsabilidade. Não há uma política educacional voltada a projetos universitários de extensão. Não há um projeto que discuta o ensino superior englobado aos ensinos fundamental e médio. Poucos governos estaduais possuem universidades públicas e, essas, não se comunicam com as universidades federais. Mesmo as universidades federais vivem em ilhas, apesar de esforços do clube de reitores e de professores.

A questão é que o Brasil tem apenas 8% de sua população graduada em nível superior e boa parte dessa porcentagem é oriunda da faculdade particular. Infelizmente, a pesquisa não faz tal distinção, mas a crise do acesso ao ensino superior seria pior se não existissem as faculdades particulares. Porém, dar acesso simplesmente por dar acesso ao título superior não me parece solução. Por todo país, as representações da Ordem dos Advogados do Brasil mostram índices de reprovação acima de 80% no chamado Exame da Ordem. Tal Exame, que é feito isoladamente Estado a Estado, é pré-requisito para que o bacharel em Direito seja efetivado como advogado. Trocando em miúdos, a OAB afirma que 80% de quem se forma no país, embora com o diploma nas mãos, não é qualificado para exercer a profissão.

O exemplo da OAB talvez sirva para todas as demais profissões. O assunto, portanto, é complexo. É preciso muita coisa: Democratizar o acesso à universidade pública; integrar o ensino superior aos ensinos fundamental e médio; integrar o ensino superior público às faculdades particulares; garantir a qualidade de ensino, tanto nas faculdades públicas quanto nas particulares; garantir a atividade de extensão; garantir política de pesquisa voltada realmente para as necessidades sociais e econômicas do país; garantir a valorização docente, o que inclui não apenas salário, mas inclusive a avaliação da docência… São pontos básicos que poderiam ser multiplicados. Certamente há outros itens, mas o fato é que as reportagens que abordam taxas de crescimento do país são, cada vez mais, meramente conjunturais, porque se trata de um crescimento dissociado de políticas de pesquisa e de qualificação profissional e técnica.

Na próxima semana, o campus da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) receberá a elite científica do país, com a Reunião da SBPC. Espero que a postura da Universidade brasileira seja tema de reflexão no evento. Até que ponto o próprio meio universitário é responsável pela situação difícil em que vive? A Universidade brasileira precisa saber de suas falhas, identificá-las, cortar na própria carne para que ganhe força e possa exigir, do governo brasileiro, que atue de forma responsável e duradoura em prol de uma política universitária mais justa. A Universidade precisa ser valorizada. A Universidade precisa se valorizar.
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Este espaço é atualizado toda segunda-feira